lundi 10 janvier 2011

o preço de um melão, sintoma de um mal mais profundo...


Para quem é angolano, pensa em kwanzas, esta foto é chocante. Para quem não sabe o câmbio, aqui vai: 9803 Kwanzas equivale a pouco mais de 100 USD.

Chocado pelo preço exorbitante de um mero melão, um internauta escreveu para a Casa dos Frescos, estabelecimento onde foi tirada a foto aqui acima, perguntando o porquê do mesmo.
Assim começou uma novela cujo fim ainda está por escrever. Aqui vão os primeiros capítulos:

Estimado senhor Catalo,

Faço parte dos muitos angolanos que, preocupados com a qualidade de certos produtos de consumo, essencialmente alimentares, encontram na loja dos frescos uma alternativa em aparência viável. Os preços são por vezes ligeiramente, por vezes bastante superiores aos praticados em outros estabelecimentos da capital angolana, mas muitos de nós nos dizemos: "é o preço da tranquilidade, da segurança de ter produtos à altura das nossas expectatitvas". Num país que viveu tantos anos com enormes privações devido ao contexto político-militar, foi sempre uma preocupação da classe média à qual pertenço não baixar por demais a fasquia no que diz respeito à qualidade do que consumimos. Encontra-se nos mercados da cidade produtos mais ou menos frescos, mais ou menos bons, porém, não temos sempre uma fiabilidade sobe a proveniência, uma traçabilidade total do produto.

Nesse contexto, alguns de entre nós, para os produtos mais sensíveis, optam por fazer um esforço financeiro suplementar para ter essa tranquilidade de espírito.
Porém, há limites. Há limites no que se pode impôr aos consumidores, em termos de preços, sob pretexto que a qualidade fala por si. Não sou o primeiro, sei disso, a dirigir-me a si a propósito do "melão de ouro". Tive mesmo acesso à sua resposta a uma das pessoas que lhe escreveu a interrogá-lo sobre o porquê de um preço tão elevado por um melão. Se me permite, retomo aqui na íntegra a sua explicação:

«Sr A_________

Junto envio os custos do “melão de ouro”

Melão casca de Carvalho de AlmeirimEuro
Custo em Portugal1,88€
Frete TAP7,8€
9,68Euro
9,68 x 1,35 = 13,07 usd per KG = CIF
CIF13,07
Direitos +custos despacho3,27
16,34Custo em armazém
1,63Peso de embalagem "paletes e caixas" 10%
17,97Preço liquido em armazém

Margem 33,5%
Preço de venda 24usd / kg = 2352kz / kg

Agora ainda não estão incluídos os custos de embalagens local nem a possibilidade de quebra do produto (que é alta), pergunto, 33.5% é alto para um produto que é perecível????

Agradeço o reenvio de este e-mail com os custos do “melão de ouro” a quem enviou este e-mail.

Infelizmente não conseguimos fazer milagres.

Melhores cumprimentos

Rui Catalo»

Sr. Catalo,

A sua explicação detalhada do preço do melão, apesar de aparentemente justificada, não me convenceu. Primeiro por causa da sua manipulação ardilosa de valores e cifras. começa por preços em euros, para preços em dolares, seguido de valores sem cifra... sem, a momento nenhum apresentar as taxas de conversão correspondentes. se é assim que apresenta as suas contas, espanta-me que não tenha tido problemas com a fiscalização mais cedo.

Admitindo que se tratem de números exactos, o senhor como comerciante aceita de bom grado investir na importação de um produto que acaba por custar ao cliente angolano 40 vezes mais do que lhe custou a si? acha coerente esta lógica económica? (claro que acha, vendendo um melão recupera o investimento na compra e importação de 5, logo, tudo o que vem depois disso é lucro puro!!!)

Senhor Catalo, o seu procedimento, o seu raciocínio faz nos pensar que sim, o senhor consegue fazer milagres, pois a multiplicação exponencial dos seus lucros (e quem fala de um melão poderia falar de muitos outros produtos sobre avaliados no seu estabelecimento) é algo de absolutamente fora do comum! Mas a culpa não é sua, o senhor aproveita as falhas, e aninhou-se numa anfractuosidade do sistema que lhe permite praticar tais preços em total desprezo pelas leis da concorrência, pois sabe que a SUA clientela não vai prescindir do seu estabelecimento.

A culpa é nossa, consumidores angolanos, que, por querermos um minimo de garantias no respeitante à qualidade dos produtos que consumimos, principalmente tratando-se de perecíveis, estamos à mercê de mercenários como o senhor, que vê em nós e muito justamente uma fonte de enriquecimento rapidíssima! Continue a fazer o que faz (não lhe ocorreu importar melões de mais perto, a custos menos importantes, afim de poder satisfazer o seu bolso e o dos seus clientes... que, se satisfeitos, VOLTARÃO!) mas tenha pelo menos a decência de não achar que está a lidar com analfabrutos, que com par de palavrinhas e cálculos de apoticário, põe no "devido lugar". Mal sabia o senhor que estava a mandar a sua resposta a um importador, que também se vê confrontado à dificuldade de trazer para Angola produtos de outra natureza mas com igual preocupação de qualidade.

Sr. Catalo,

Como eu, como o Sr Alexandre, há dezenas de pessoas a reagir em redes sociais, em conversas pela cidade, pelo mundo fora, pois isto é algo que choca verdadeiramente a sensibilidade de qualquer pessoa que viva do seu salário, que tenha noção do que custa ganhar 100 dolares para os gastar de uma vez num perecível, num mero e simples melão que lhe custa 1,88€... Sei que compreende a nossa indignação, pois se hoje é importador, um dia já foi mero consumidor, e já barafustou para com os seus botões contra o custo da vida, contra a discrepância entre os aumentos dos preços e a pouca valorização do TRABALHO em Angola, que a poucos e raros permite viver com dignidade e algum desafogo. Se teve o privilégio de nunca ter tido esse "problema de pobre", certamente há de conhecer alguém que o tenha vivido. Não lhe peço "milagres". Não lhe peço mudanças, pois o senhor está inserido numa lógica económica que, enquanto funciona, e enquanto não lhe são pedidas contas por quem de direito quanto ao preço que pratica por um melão (seja ele um senhor melão de 4 kgs!), não tem razões para mudar. Quero apenas dizer-lhe que, como eu, como os demais a quem chegou e fiz chegar a informação sobre o "melão de ouro", há toda uma franja da poulação, activa, honesta, trabalhadora, sacrificada, que não quer continuar a sofrer os efeitos desta especulação sem nome, de que certamente não é o único culpado, mas um cúmplice e beneficiário.

Espero que esta mensagem lhe chegue clara e límpida, na certeza porém de que ela não comporta qualquer animosidade dirigida à sua pessoa, apenas retrata o sentimento de muitos angolanos em relação ao que se passa no nosso País.

Cordialmente,

RB

9 commentaires:

  1. Glenn,

    Obrigado pelo artigo. Com certeza estarás de acordo com muitos dos pontos deste outro artigo:

    http://havemosdevoltar.wordpress.com/2011/01/10/coisas-que-me-fazem-confusao-na-cabeca/

    Abraço aí

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  2. Fantástico.
    Sou amigo pessoal do Rui Catalo...mas... não faço as minhas compras lá! É um facto que ele tem uma qualidade muito acima daquilo a que nos temos habituado na nossa terra, mas não vale a pena abusarmos.
    Ele uma vez disse-me com um sorriso na cara: "...compra este produto X aqui ao lado que te sai mais barato, eu aqui vendo tudo mesmo caro...", palavras para quê?????
    Tiro-vos o chapéu a este acto de discórdia e descontentamento.
    Um bem haja.
    PM

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  3. Na realidade a malta tem que começar a boicotar estes lugares, parando de comprar lá. É uma realidade que Angola é o país mais caro do mundo, mas há coisas que são um verdadeiro exagero.

    O chato de tudo isso, é que para ter produtos de quali...dade razoavél em casa temos que nos submeter a este tipo de coisas. Se forem a analizar bem, este melão veio para Angola de avião, pagou despesas mais caras e está a ser vendido num lugar que provavelmente tem despesas de operação carissimas com alojamento, gerador e posicionamento geográfico.

    Resumindo e concluindo... se queremos uma vez ou outra comer frutas e legumes bonitos há que pagar o preço. Mas enquanto o comerciante Angolano tiver que gastar dinheiro em combustivél e outras despesas superfulas, não há sequer maneira de os obrigar a baixar preços. Na verdade as pessoas calculam o PVP com o maximo estabelecido por lei em cima do custo do produto com todas as despesas de importação, desembaraço, etc.

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  4. Meus senhores,

    Eu tenho acompanhado esta "historia" do melão do ouro...
    e devo dizer que no meu ponto de vista a culpa n e casa dos frescos, mas sim das autoridades competentes quem n sabem explorar um pais com excelentes qualidades agrícolas, e n só, também as autoridades competentes à fiscalização.
    Mas, uma coisa é certa a Casa dos frescos so pratica esse tipo de preços pq ainda n tem um concorrente à altura em termos d produtos e garantia qualidade dos mesmos...

    Cpts,
    BC

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  5. Obviamente que também eu fiquei chocada com o preço desse melão, e digo-vos: NÃO COMPRO UM MELÃO POR 100 USD, nem que tenha dinheiro de sobra no bolso porque ... sinceramente, não faz sentido.
    No entanto, se tal preço é praticado é porque há quem os compre, e que melão algum sobre, não duvido nada. Afinal, em Angola rola muito dinheiro e se para muitos de nós isto é indigno para outros acredito que nem tanto porque se calhar nem reparam no dito preço afixado.
    Eu sou cliente da Casa do Frescos e por uma razão muito simples. Gosto da qualidade dos produtos frescos, da variedade de certos mimos que só ali encontro, da segurança que me transmite comprar nesse estabelecimento, o conforto e a tranquilidade, e é óbvio que tudo isso se paga. Nada contra. Em qualquer parte do mundo, o luxo é pago a parte, todos o sabemos, porém, há também que ter noção dos limites. Limites esses que só acabam por ser ultrapassados pela falta de concorrência porque a Casa dos Frescos é a única em Angola que oferece tais condições, todas que citei acima, aos clientes. Porém, não faço lá todas as minhas compras. Outros bens essenciais eu compro noutros estabelecimentos por um preço bemmmm mais baixo, mas pronto, não ponho isso em discussão. Compro o que quero onde quero e volto a repetir que gosto muito da Casa dos Frescos, sua organização, higiene, etc, mas ... 100 usd por um melão eu não pago.
    Sugiro ao sr. Catalo que reveja as suas contas e certamente poderá fazer um preço mais amistoso do referido melão, tendo lucro na mesma. Talvez não tanto, mas mais justo e não correndo o risco de ficar mal falado depois de ter conquistado o nosso mercado mesmo apesar de sempre ter praticado preços mais elevados que o normal, mas que até então te sido tolerados por todas as razões que já citei.
    Então, não custa ter esse gesto de boa vontade e atenção para com os seus clientes.

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  6. Caros,
    Estamos todos "com um melão" como se diz em Portugal, por causa deste incidente, mas parece que muitos se esquecem que a situação é generalizada no comercio angolano, desde os automoveis, passagens aéreas, escolas particulares, clinicas e etc, ou ainda, nas casas e apartamentos de um melão, aliás 1 milhão :), para não falar das tarifas de telemovel ou internet,
    Destaco aqui, porque tem a aver com alimentação, o caso dos vinhos portugueses que são vendidos em lojas e restaurantes que, com pompa, a preços ELEVADÍSSIMOS, em proporção totalmente inversa à sua qualidade!!!!!A maior parte do vinho portugues vendido em Angola é de má qualidade ( gosto adstringente, e acidez elevada, sem a elaboração do vinho sul-africano do mesmo nivel (?)- como exemplo mais proximo. Claro que não devo generalizar na comparação, pois em todos os paises ha bons e maus produtos, mas o que é verdade é que a maior parte do vinho português que se vende por aqui ou nos oferecem em cabazes de luxo, ou em festas de sociedade ou ainda na primeira classe da nossa companhia de bandeira - TAAG -, deixa muito a desejar a um apreciador mesmo iniciado que tenha provado nectares da Africa do Sul, Australia, Argentina, America ( California, Napa Valley, Oregon) Chile, California, Nova Zelandia de preços inferiores`aos daqueles.
    Na Africa do Sul, uma carta de vinhos local, raras vezes apresenta vinhos acima dos 80 USD, e os enólogos , de facto, começam sempre por porpor ao cliente vinho a preço baixo competindo a este optar por mais caros.
    Mas em Angola, ha o descaramento de nos proporem ( assaltarem ) vinhos logo acima dos 100 USD e até 6.000 USD!!!!!!!!!
    Um certo restaurante nos COqueiros ganha $1000 de lucro numa garrafa de Chateau Petrus que compra num importador estabelecido em Talatona que vende ao publico a $5.000!!!!!!
    Esta inflação é proporcionada por clientes endinheirados que,ridiculamente, olham mais ao preço do que à qualidade, eventualmente com más referencias, que são isca fácil para os predadores instalados em restaurantes e lojas,que lhes dispensam atenções e vénias cínicas.
    Portugal congratulou-se ha pouco por ser o maior exportador de vinho para a Angola, situação de ha mais de 30 anos. Mas deveria preocupar-se com a qualidade do vinho que, no geral, deixa muito a desejar e a algumas pessoas deixa interrogadas se haverá melhor do que o que cá chega!
    Porque não é o maior exportador para Inglaterra ou Singapura?
    Os icones da sua garrafeira mais badalados por cá - Barca Velha, Quinta da Bacalhoa, Esporaão e sobretudo o famigerado Monte Velho( nem outeiro devia ser)não resistem a um teste cego com vinhos 10x mais baratos do Novo Mundo.
    Sexta e sabado proximos no Hotel de Convenções de Talatona, haverá finalmente uma prova de vinhos da África do Sul que espero leve a inverter as tendencias actuais e a reduzir o tamanho do embuste que nos sufoca.
    Julio Sousa e Silva
    Luanda

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    1. Caro Julio
      Vinhos monocasta como os que refere nem aos pés dos vinhos elaborados que prova e degusta das videiras europeias, quanto ao preço por certo que a tabela aduaneira que não é igual, entre Angola e a Africa do Sul e por exemplo Portugal. Depois a qualidade paga se. A capacidade de volume de produção é que é enorme nesses países comparativamente.
      Mas claro é apenas uma opinião.
      Obrigado

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  7. Sr. Catalo gostaria me contactasse, pois tenho melão de muito boa qualidade e muitissimo mais barato, inclusivé exportamos muitas toneladas para Portugal e Espanha. meu email naturetradebrazil@gmail.com. António Manuel campos

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  8. Gente boa!
    Há quem saiba e quem não saiba do que está a falar. Começam por falar do "Melão de ouro" e acaba-se a tentar impingir vinho sul-africano...

    Voltando ao Melão: Atentem ao preço de custo em armazém (que grosso-modo me parece correcto), multipliquem pelo peso (4,168 Kg), adicionem as margens legais (25% p/o Importador) e (14% + 25%) para o Retalhista. Resultado: O preço de venda reclamado até fica muito abaixo do legalmente aceitável. De resto, é saudável preocupar-mo-nos em providenciar alternativas de produção nacional com a qualidade desejada e, com isso, talvez, obtermos preços ao consumidor mais acessíveis.

    Ivo Barata

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