jeudi 21 janvier 2010

CAN vs CONSTITUIÇÃO

Angola, esta pequena grande Nação, está de parabens. Com todas as dificuldades que atravessámos ao longo das últimas décadas, com meios insuficientes (o País tinha que suportar o esforço de guerra), conseguimos alcançar um patamar importante a nível do desporto nacional, com uma participação à Copa do Mundo de Futebol em 2006 e a atribuição da organização do CAN (Campeonato Africano das Nações) em 2010. Angola vem conseguindo avançar a passo a passo no desporto rei, aquele que faz levantar multidões pelo mundo afora, que provoca tanta alegria nos corações de maneira indiferenciada, da Europa a África à América à Ásia...

E eis que chegou a hora de vibrarmos pelos nossos Palancas, estes heróis de uma Angola actual, que utilizaram a mais pacífica das armas - o desporto - para enaltecer o nome desta sofrida Pátria que tão orgulhosamente representam. São heróis, não exagero ao dizê-lo, pois apesar das dificuldades, estão a dar até a última gota de suor pela camisola vermelha e preta, e pelo que sei, são hoje dos poucos que o fazem e são mais ou menos reconhecidos; são heróis pois são muitas vezes jogadores vindos de um meio desfavorecido, de bairros populares, e conseguiram com o futebol, dar um rumo positivo à suas vidas e servir de exemplo, de locomotiva para os demais que atrás se encontram. E este CAN a domicílio está a ser a ocasião para estes heróis mostrarem o seu valor diante dos seus, que os apoiam de forma incondicional, almejando a vitória suprema na competição; está a ser a ocasião para Angola mostrar o seu lado positivo, a sua capacidade de organização e acolhimento de um evento de proporção Continental; está a ser uma ocasião de mostrar ao mundo que ANGOLA ESTÁ A MUDAR! Viva Angola, viva o CAN!

CONTUDO... Paremos para pensar um pouco... pensar no que é Angola hoje; no que significa para o País acolher um evento de tal importância. Como está Angola HOJE?

Em Fevereiro de 2002, Angola saiu definitivamente do estado quasi-permanente de guerra que tinha sido o seu desde bem antes da Independência. Parecendo que não, já lá vão 8 anos. O que foi feito durante estes 8 anos? Muito? Pouco? Sabe-se apenas que o País «está a crescer». As necessidades básicas (casa, trabalho, comida, acesso à água potável, à electricidade, à educação e à saúde) ainda estão longe de ser satifeitas para uma grande maioria da população; pode-se mesmo dizer que em Angola quem consegue reunir este leque de condições é um verdadeiro privilegiado, mesmo que por vezes não tenha consciencia disso. O problema é que, sendo estas necessidades básicas, não deveria ser um privilégio satisfazê-las... Deveria ser a base daquilo que se propõe a um povo que já tanto sofreu, que tão corajoso foi e continua a ser. Angola, são uns meros 15 milhões de habitantes (usando como base de comparação algo que eu conheço bem: Paris e a sua periferia, são 12 milhões de habitantes), e apesar da guerra e dos problemas, já podíamos estar noutro patamar de desenvolvimento. Será que soubemos gerir condignamente as prioridades em função das necessidades daqueles que constituem a maioria, ou seja, a população angolana? Quanto será necessário para lançar e levar a cabo um verdadeiro projecto de saneamento, rehabilitação e renovação da rede de águas e esgotos de Luanda, por exemplo? Quanto dinheiro? Quanto tempo? Mais, menos do que foi necessário para construir quatro estádios de raíz, hotéis a dar com o pau, etc, etc...? Será que numa cidade onde vivemos apinhados, engalfinhados uns em cima dos outros, a prioridade em termos de construção vai a hotéis e estádios?

Pois é, as perguntas mereciam reflexão, mas isso era antes, agora já está, faça-se, cumpra-se o programa e seja o que Deus (!) quiser...

Foi pois neste contexto de euforia, de festa futebolística, de feriados e tolerâncias de ponto mais ou menos arbitrárias, que foi votada no Parlamento a nova Constituição, Lei Orgânica da IIIª República. Em pleno CAN. Sim, sim. Num momento em que as atenções do Povo estão viradas para outros assuntos. Não que o Povo pudesse fazer o que quer que seja para mudar a Constituição, afinal de contas esta foi votada e aprovada pelos seus legítimos representantes eleitos (!), cabe-lhes a eles ser a voz das massas. Se estas senhoras e senhores, investidos de tais responsabilidades, julgaram que esta era a melhor Constituição possível para o Povo Angolano, bem haja! Cumpra-se, e vejamos.

Não está sequer em cause discutir o conteúdo da Constituição (ainda) neste blog, pois eu ainda não tive tempo de me debruçar sobre ela. Mas a questão que me vem à cabeça é a seguinte: o facto de ela ser votada em plena Copa Africana de futebol retira-lhe muito evidentemente a atenção que ela merecia ter, quer da parte dos media como do povo. Será que isso não é nocivo à plena compreensão por parte dos cidadãos angolanos da importânciia histórica de tal voto, de tal aprovação? Será que o Angolano X ou Y, no fim do ano 2010, considerará a nova Constituição o evento mais importante do ano decorrido para o País, ou será o CAN? Que benefícios tiraremos de um e de outro, e sobretudo, que impacto real terão os dois sobre a vida de Angola e dos angolanos? Uma vez o CAN encerrado, será que a mais valia do mesmo será tão evidente quanto se disse que seria para o País? O que é que o CAN gerou? Empregos? Vantagens económicas? Oportunidades de formação, de aprendizagem a qualquer nível que seja? Quem nos saberá responder? A quem devemos nós, angolanos, indagar? Especula-se sobre o que foi gasto em termos de infraestruturas, mas quem as construiu? será que os angolanos adquiriram um "know how" qualquer com isto tudo, que saberemos em seguida aplicar em diversos sectores para a reconstrução e reorganização do nosso País? Ou "importámos" até a mão de obra para depois aumentarem as desigualdades entre os angolanos e os outros? Eu não sei até que ponto é perigoso para nós termos desviado tanto a nossa atençao do que é mais importante, mas que é essencial que corrijamos o tiro, lá isso é.

Eu encorajo todo e qualquer Angolano a procurar adquirir um exemplar da Lei Orgânica em vigor, se possível da anterior, e inteirar-se do que mudou ou não, do que significam as mudanças de estatutos e responsabilidades de cada cargo; em caso de dúvida, não hesitemos a interrogar alguém mais entendido do que nós em matéria legal, mas é importante que tenhamos consciência do que É uma Constituição para um País. Somos uma Nação jovem, uma democracia mais jovem ainda; temos muito tempo a recuperar, uma proporção ainda muito grande da população analfabeta e para quem o essencial não está nestas páginas, mas elas são importantes para todos nós; não há poder maior do que a sabedoria, e o conhecimento dos nossos direitos, deveres e prerrogativas dentro do nosso País é um passo muito importante para aprendermos a contribuir da melhor maneira para a sua melhoria.

samedi 9 janvier 2010

Um Longo Caminho a percorrer


Minha Angola, Angola minha... minha Angola está de luto; minha Angola está chorar, antes mesmo de festejar. Esta prometida festa, a mais bonita que já se viu, no País e no Continente, começou com um brutal e funesto despertar para a realidade. A REALIDADE: anos de guerra, instabilidade e conflitos regionais que, apesar do fim da guerra entre facções, deixaram mazelas, ideias, pessoas, armas que de vez em quando se fazem ouvir da pior maneira, e neste caso na pior das ocasiões. Um País que queria mostrar ao mundo a sua capacidade de sarar as suas feridas e reorganizar a sua vida para crescer, acaba por ser visto como um foco de terror, onde não se pode assegurar a segurança dum evento de tal importância.

Temos todas as circunstâncias atenuantes possíveis: a equipa do Togo escolheu o caminho terrestre, ao contrário do previsto para a entrada deles em Angola; a FLEC, grupo independentista que reivindicou o acto, agiu a partir de células situadas no Congo, território onde as autoridades angolanas não têm soberania nem legitimidade para agir; mas no fundo no fundo, este atentado atinge a todos os angolanos sem excepção, aqueles que sonham com um País ENFIM no caminho da prosperidade, e que acreditaram - apesar de tudo, pois é certo que há prioridades mais vitais - que o CAN seria uma vitrine para mostrar ao Mundo os progressos de Angola a nível de estabilidade, de organização e de capacidade de mobilização em prol de um objectivo comum.

Em princípio, o CAN vai acontecer. Esperamos que sem mais ataques ou qualquer outra coisa de natureza a manchar mais uma vez o nome de Angola. Chega de sangue. Chega de falar com as armas. É tempo de deixarmos falar a nossa força de vontade, e de tentar viver em Paz. Connosco e com os outros.

(Os meus pensamentos vão às famílias das vítimas desta barbárie. Estas perdas serão para sempre motivo de tristeza para eles e para o povo angolano, que acredito que na sua grande maioria esteja tão chocado quanto eu.)

jeudi 7 janvier 2010

Identidade Nacional


Em França, o tema faz furor e debate desde a subida de Nicolas Sarkozy ao poder: A identidade Nacional da França e dos franceses. Até foi criado um ministério da Imigração, Integração e Identidade Nacional!!!
Não foi tanto a questão mas a forma e as implicações de tal acto que levantaram protestos. Este Ministério foi encarado pelas diversas comunidades de franceses de origem estrangeira (essencialmente africana e norte africana, as comunidades mais discriminadas em França) como um "filtro" para se identificar os bons e os maus franceses, os "verdadeiros" e os "falsos".

Toda esta polémica veio acaparar a questão principal, que eu me coloco aplicando-a ao meu caso particular, a saber, a Identidade Nacional Angolana. O que é ser Angolano? Quem são os angolanos?
Angola tem uma história rica e complexa, e para compreender quem nós somos, temos que nos debruçar sobre de onde viemos. Angola, o País independente e soberano, existe desde 11 de novembro de 1975. Antes, era Angola, província ultramarina de Portugal. Logo, os Angolanos eram portugueses (ao mesmo título que os madeirenses são Portugueses). Logo, TODOS os indivíduos nascidos em território angolano, brancos, negros ou mestiços, eram Portugueses. Aquando da mudança de estatuto do território de província para País, como e quem procedeu à distinção entre Angolanos e Portugueses? Quais os requisitos para se requerer legitimamente esta nova cidadania? Quem teve o papel do Rei Salomão e cortou a criança ao meio?

Eis aqui a utilidade de se escrever e transmitir às gerações que nasceram depois de 75 a forma como tudo se passou. Eu posso apenas depreender, interrogar-me, e interrogar os meus familiares que viveram este período, mas a História de Angola necessita de mais fontes documentadas, idóneas, multiplas e concordantes, e isto enquanto muitos dos protagonistas dessa transição estão ainda em vida. Da História de Angola, dos reinos pré-existentes à chegada dos colonos ao estabelecimento de fronteiras "artificiais" que respondiam a interesses geo-políticos dos europeus e não às verdadeiras fronteiras entre os diferentes reinos, povos e culturas, daí e somente daí pode nascer a noção de Identidade Nacional; da plena consciencia de todos os fenómenos que influenciaram a criação do nosso País. Um Cabindense terá certamente uma cultura mais próxima da cultura dos Congos do que da dum Namibense, que se identificará mais facilmente com os hábitos, costumes e línguas dos povos do norte da Namíbia. Mas o Cabindense e o Namibense são Angolanos. A minha filha, de mãe Francesa, que vive em França e (ainda) não conhece Angola, é Angolana. Negar-se a angolanidade dela, seria negar o elo que a liga a mim.

Ser angolano transcende uma simples questão de etnia, de cor de pele, de elo geográfico; ser angolano é ter uma história, uma raíz íntima e legitimamente ligada àquele País; ser Angolano é conhecer a realidade do País, as dificuldades que nele se vivem, mesmo não estando lá a viver; ser Angolano é ter amor àquele chão, àqueles rios, àquele mar, àquele povo; ser Angolano é levar a vida sempre que possível "na desportiva", malembe malembe, porque se resolveste um problema hoje, amanhã outros virão; ser Angolano é ter alegria no coração, que bate ao ritmo do semba dos nossos anciãos; ser Angolano é ser consciente do sofrimento passado, mas também e sobretudo do potencial presente e futuro, e fazer o seu possível, cada um ao seu nível, por que este não seja desperdiçado; ser Angolano é querer deixar uma Angola próspera, pacífica, limpa, organizada e livre para os nossos filhos e os filhos dos nossos filhos; ser Angolano não é ser arrogante, mas orgulhoso do nosso percurso, que apesar de todos os problemas, das curvas e contracurvas, é e tem que continuar a ser ascendente; ser Agolano é, para mim, amar Angola, o suficiente para fazer ouvir a sua voz, criticar na esperança de melhorar, não denegrir; ser Angolano é meter mãos à obra para transformar este milhão duzentos e quarenta e seis mil e sete centos kilómetros quadrados no País mais bonito do mundo. SER ANGOLANO É AMAR ANGOLA. Mas amar requer também ser exigente em relação ao que se ama. Ser exigente com Angola, quando se é Angolano, é antes de tudo ser-se exigente consigo próprio. Ser Angolano é complicado...!